quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Texto 5

O motivo de eu ter ficado algumas semanas sem postar foi a falta de material mesmo. Começamos a estudar, no curso, a escrita teatral, as peças, desde Grécia antiga até contemporânea. Posso dizer que é a "área" com a qual eu menos me identifiquei. Simplesmente não sai nada. Cada exercício foi um parto e mesmo assim ficou horrível. Vou postar esse mais para não ficar tanto tempo sem nada por aqui. Espero que no último módulo do curso as coisas melhorem.
Bom, o exercício consistia em escrever um "diálogo ausente". Trata-se de uma conversa onde o leitor/espectador tem acesso a apenas um lado da conversa, tendo que imaginar, supor o outro. Um exemplo bem fácil para esse tipo de diálogo é uma conversa ao telefone. Você não ouve o que está sendo dito do outro lado da linha, mas pelas palavras e reações do personagem que você lê/assiste, é capaz de supor o que está sendo dito do outro lado. Às vezes isso pode ser usado num personagem que esteja delirando, por exemplo, falando consigo em voz alta. Eu usei um outro método, o de apenas suprimir as falas do outro interlocutor, o que só funciona mesmo na leitura, pois não seria possível esse texto numa encenação, já que claramente a outra pessoa está fisicamente presente no mesmo ambiente do personagem que fala. Eu disse que escrever para teatro não vai ser nunca a minha praia... Eis o (curto) texto:



"Entre, por favor. Fique à vontade.

Aceita um café, água?

Gelada ou natural?

Aqui está. Sente-se.

Confesso que sua mensagem me surpreendeu.

Porque não imaginei que fosse saber de você tão cedo.

Imagina, não teria motivos para não receber você. Embora não tenhamos terminado nos melhores termos, não é para tanto.

Estou bem, tudo indo na paz. E com você?

Que bom.

Ah sim, mas para quem não está difícil hoje em dia, não é? Mas enfim, você não me disse exatamente sobre o que quer conversar comigo.

Ah, você sabe que eu não gosto de rodeios.

Sim, eu também não gosto de conversas virtuais. Por isso estamos aqui agora.

Bom, se você diz... O que posso dizer é que para mim não só foi difícil, mas também surpreendente. Levar um pé na bunda de repente do jeito que foi, não é nada agradável.

Aí já uma questão de semântica. Se você prefere outra expressão, fique à vontade. Eu fico com ‘pé na bunda’ mesmo.

Se eu estivesse com raiva você não entraria mais na minha casa. Só que nem por isso eu vou fazer de conta que as coisas que aconteceram não aconteceram. Você disse que queria falar comigo. Embora eu imaginasse que fosse isso, resolvi pagar para ver. Vai que você tinha a intenção de se desculpar, pelo menos.

Percebo que continua a mesma pessoa. A culpa é de ambos? De onde você tirou isso?

Era só você ter me dito isso. Só que eu sei e você também sabe que isso não é verdade.

Acredite naquilo que te deixa com a consciência tranquila, só que eu não vou aceitar que você venha na minha casa e diga na minha cara que você pulou a cerca por que eu estava “diferente”. Ao menos tenha a decência de assumir.

Ah, tenha dó. Você vai mesmo me dizer que a carne é fraca?

O que eu já entendi é que você é uma pessoa covarde, mimada, egocêntrica e escrota. Aposto que pensou que eu iria ficar correndo atrás de você, implorando por uma reconciliação. Quando viu que eu liguei o foda-se, ficou com o ego ferido e me procurou. Tentando reverter o jogo e fazer com que eu sinta a culpa. Perdeu tempo.

Se eu estou com outra pessoa, isso é problema meu e dessa eventual outra pessoa. Não existe nenhuma razão para eu dar satisfações da minha vida a você.

Pelo visto vai continuar com esse cinismo. “Nossa história”. Aliás, agora é só isso mesmo, história. Eu honestamente achei que pudéssemos ter o mínimo de convivência respeitosa, mas vejo que não será possível. E agora vou pedir para você ir embora. Não tenho mais nada para lhe dizer e ainda que você tenha, confesso que não quero ouvir.

Descer com você? Não precisa. Só chamar o elevador, apertar o zero até o térreo e sair por onde entrou. Caso o porteiro não esteja lá, interfone que eu abro o portão por aqui.

Ótimo. E por favor, nunca mais me procure. Espero nunca mais saber de você e desse seu ego tóxico. Vocês não são mais bem-vindos aqui. Passar bem."




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